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Cresce o número de brasileiros que acham a grama do país vizinho mais verdinha

Desde a adolescência, Patrícia Lima tem o sonho de morar fora do Brasil, assim como milhões de brasileiros: “Eu sempre tive isso, nunca me encaixei com a cultura brasileira, tudo o que eu escuto é em inglês”. Cada vez mais, esse desejo coletivo de sair definitivamente do país está se tornando realidade. Entre 2011 e 2015, houve um crescimento de 67% nas declarações de saídas da Receita Federal, isto é, 50.905 pessoas não vivem mais em solo brasileiro.

E quais seriam os motivos para essa crescente saída? A inflação que permanece alta? A economia brasileira que não tem inspirado a confiança? O trânsito e a lotação nos transportes públicos? Para a família de Thayna Orosco, as razões para essa mudança foram o estresse do trabalho e uma sequência de três assaltados que a matriarca sofreu no final de 2014.

Thayna e a mãe Luciana Mello em Portugal

Mas morar em outro país não tem sido fácil para Thayna, de 20 anos. “Muitas vezes nos sentimos sozinhos e pensamos: será que isso tudo realmente vale a pena? Ter avós no Brasil e saber que qualquer dia eles podem ficar doentes, falecer e você nem se quer poder vê-los. E é obrigado a se acostumar com cultura, música, comida, pessoas, língua, leis e regras.”

A família morou por um ano e três meses nos Estados Unidos porque não conseguiu o visto de permanência, e voltou para o Brasil em fevereiro de 2015. Durante esse tempo, a jovem adquiriu experiência em duas pet-shops, como garçonete e como ajudante de limpeza. Na última função ela trabalhava por períodos que variavam de 8 a 12 horas, e ganhava entre 8 e 50 dólares por dia, dependendo do tamanho das casas. E não ganhava vale-transporte ou refeição, como ganhava no Brasil.

Apesar de ser um caso diferente de Thayna, por ir para a Irlanda com um visto que lhe dará liberdade para trabalhar e estudar por oito meses, Patrícia Lima, de 32 anos, sabe que a vida por lá não será fácil e que passará por experiências parecidas com as da jovem. “Não adianta ter um diploma e achar que vai ter o emprego dos sonhos, que vão te amar. Não, vão te olhar e falar ‘você é brasileiro’. Posso chegar lá e eles não me respeitarem. Te darão o emprego que ninguém quer, o subemprego.”

Patrícia planeja há dois anos sair para nunca mais voltar para o Brasil. Ela não quer apenas fazer um intercâmbio, quer realizar seus sonhos e objetivos. Com essa mudança ela deseja conhecer as arquiteturas e belezas da Europa, melhorar seu inglês no curso que fará pela agência de intercâmbio Egali House, crescer como pessoa e se conhecer, aumentar seus leques para escrever os roteiros que faz há 20 anos de forma amadora, e crê que precisa aprender com os outros lugares, pois já conseguiu adquirir tudo o que poderia do Brasil. Além disso, não há nada que a prenda aqui. “Não sou casada, não tenho filhos, moro com os meus pais… pode ser que não dê certo e posso voltar ferrada, mas por ver tudo aquilo que desejo já vai valer a experiência.”

Ela escolheu a Irlanda - para onde irá em setembro de 2016 - como destino por acreditar que este é um povo que aceita melhor os brasileiros tanto que eles já são 10% da sua população. Além disso, a maioria dos cidadãos tem a mesma faixa de idade de Patrícia e eles estão acostumados com turistas. Por esses motivos, ela tem confiança de que conseguirá, em um futuro próximo, um emprego na área em que se formou, de publicidade e propaganda. Esse emprego representará um visto para ela viver permanentemente na Europa.

Patrícia já está de mala quase pronta para a Irlanda
Para executar esse plano, a ex-auxiliar administrativa investiu R$ 23 mil que foram adquiridos com a venda do carro e com a rescisão do emprego. Esse valor vai custear o curso de inglês de seis meses, dois meses de férias, transfer do aeroporto para a casa onde ficará nas primeiras duas semanas, um seguro governamental, um ano de seguro privado, passagem e o depósito que comprova ao governo Irlandês que a brasileira não passará necessidades.

Essa crescente saída definitiva de brasileiros tem chamado a atenção, pois até cinco anos atrás não acontecia com tanta frequência, quando a taxa de desemprego estava baixa e a inflação controlada, segundo dados do IBGE e Datafolha. Naquela época, mesmo quando a população pensava em ir para outro país, já tinha na planejado quando voltar.

Mas o número de desempregados não está grande apenas no Brasil: 8,9% da população da União Europeia - que é o futuro e presente lar das entrevistadas - estava sem ocupação em fevereiro de 2016, segundo dados da agência europeia de estatísticas Eurostat.

Depois que a família de Thayna saiu dos Estados Unidos, voltou para o Brasil e permaneceu aqui por três meses, para se preparar para o próximo destino. Eles foram em maio de 2016 para a terra de seus antepassados portugueses para refazer a vida.

Em apenas dois meses, Thayna já conseguiu sentir a crise econômica que o País sofre e viu as diferenças entre o Brasil e Portugal. “Esse país está em crise também, não se tem muito emprego e muitas pessoas estão indo para o resto da Europa, principalmente para a França. É um país muito rural, antigo, tem casas feitas de pedras, mais para o interior, com ovelhas e cabras, o ar é bem puro, cheio de plantas e muita água…”

Para Patrícia, a ideia de ir embora do Brasil por causa da crise econômica não é uma boa justificativa, por que para ela o mundo todo está em crise. Ela diz que, se as pessoas acham que vão ganhar muito dinheiro em outro país, não vão, porque o que ganharem vão gastar para se manter, afinal, nada é barato no exterior.

Quanto ao futuro, Thayna ainda não tem muita ideia do que fará. “Se a situação no Brasil melhorar, pretendo voltar, amo o Brasil, mas acho uma palhaçada total tudo o que está acontecendo. Sei que em vez de sair do país, devia lutar contra, mas sozinha não consigo. Então, por enquanto, vou fazer faculdade aqui em Portugal no ano que vem, não sei muito bem o que vou fazer. E também não sei meus planos para o futuro...”

E para viver bem em Portugal, a família Orosco está tirando a cidadania. Mas esse é um processo longo, que ainda não tem data para acabar, já que, primeiro, a bisavó terá que tirar o documento, para depois a avó, após isso a mãe, e, por fim, Thayna e seus irmãos.

Além da decisão de viver fora do Brasil para um longo tempo, as duas brasileiras têm outra coisa em comum: sabem que sentem e continuarão sentindo uma saudade que não tem data para acabar, da família e dos amigos.

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